Laurindinha

Ah, Laurindinha…. Trinta e cinco anos se passaram…. Lembro de nós dois, Laurindinha, de mãos dadas, sentados num banco de praça, olhando o por do sol… Trinta e cinco anos maravilhosos que passamos pensando como seria o nosso futuro e sem lembrar da morte que um dia chegaria… Trinta e cinco anos, quase uma vida inteira, vida que passa tão rápida e tão de repente e vem cheia de surpresas. Trinta e cinco anos, e eu nunca te contei aquele segredo que eu disse que tinha, Laurindinha, e nunca te disse o que era.

Amigo leitor, deixe-me corrigir um pouco a sua imaginação, que a esta altura já foi pro lugar errado. Primeiramente, Laurindinha, ou Laurinda, pra você, não era uma velhinha. Ela nasceu no interior de Minas Gerais, numa época recente, onde o povo achava que a ultima moda era colocar na filha nome de protagonista de novela de época que estava reprisando no “vale a pena ver de novo”. O nome Laurinda evocava sempre aquela avó mais velha de todas as avós. Lembro-me que quando ela ainda tinha 25 anos, uma vez ligaram lá pra casa, perguntando se poderiam falar com a senhora dona Laurinda. É nome de velho, não tem jeito!

Segundo, meu amigo leitor, Laurindinha não morreu. Nós nos conhecemos e casamos quando ela tinha quinze anos. Nossos pais – amigos de infância – se encontravam todas as longas férias no interior de minas e eu e Laurindinha também. Desde cedo ela era apaixonada por mim, três anos mais velho. Quando completou quinze anos, revelou seu sonho ao seu pai. Que queria se casar comigo naquele ano, e mudar para o Rio de Janeiro. Ela queria ver o mar, e queria morar no Rio e queria casar comigo. Eu tinha um emprego maravilhoso para um rapaz de 18 anos, mas que era apertado pra pagar as contas e ter uma casa. Mas naquele dia acho que eles beberam tanto que acabamos casando por lá mesmo e fomos morar no Rio de Janeiro, num apartamentinho emprestado, que acabou sendo nosso depois.

Então, amigo leitor, Laurindinha era um mulherão de 50 anos, que há trinta e cinco vivia comigo. Ela era uma mulher excepcional em todos os sentidos. Vivemos juntos estes trinta e cinco anos com muitos altos e baixos e ela sempre esteve ao meu lado, em todos os momentos. Nunca tivemos filhos e  isso nunca foi razão de tristeza para nós – pelo menos ela assim dizia. Ela fez todas as plásticas que quis e nunca precisou. Vivia morena de praia, apaixonada que era, e despertava a cobiça dos meus invejosos vizinhos que nem sonhavam a mulher incrível que Laurindinha era além das meras aparências.

Agora, aqui estou eu, sentado no banco de praça que nós sempre sentávamos, pensando por que ela foi embora. Ah, e esse banco de praça, amigo leitor, não fica numa praça. Alguém tivera a brilhante idéia de incrustrá-lo nas pedras mais altas do lado da praia, de onde dava para ter a mais linda vista do por do sol. Olho para baixo na praia e vejo ela indo embora com os outros surfistas, sem ao menos olhar para trás.

Eu acho que Laurindinha foi embora por causa do segredo. Aquele segredo que eu nunca pude contar pra ela. Aquele segredo tão bem guardado, que eu jurei que não podia contar para ela, um pouco antes da gente se casar. Mas eu disse para ela que havia este segredo, e ela aceitou casar comigo sem ao menos saber o que era. Mas talvez tenha sido o peso dos anos que passaram. Ela sempre insistia, e eu sempre negava.

Depois acho que ela acostumou com as minhas negativas e só perguntava sobre isso a cada cinco anos. Eu acho que foi isso que eu entendi quando ela me olhou quando eu disse que eram trinta e cinco anos juntos! Acho que era por isso mesmo que ela estava indo embora. Trinta e cinco anos e eu não contava para ela o segredo. Laurindinha, meu amor! Como eu ia contar pra você, que depois destes trinta e cinco anos, eu não faço mais a menor idéia do que era o meu segredo?

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